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O lado oculto da educação em Portugal: o que os dados não mostram

Há uma narrativa que se repete nos corredores do Ministério da Educação e nas salas de professores por todo o país: Portugal está a melhorar. Os números do PISA são exibidos como troféus, os rankings das escolas transformam-se em manchetes, e os discursos políticos falam de uma 'revolução educativa' em curso. Mas o que acontece quando se desce ao terreno, quando se fala com quem realmente vive o sistema todos os dias? A história que emerge é bem diferente da que aparece nos relatórios oficiais.

Nas últimas semanas, percorri dezenas de escolas, desde o Algarve até Trás-os-Montes, e encontrei uma realidade que os indicadores internacionais não captam. Na Escola Básica de Vale do Sousa, uma professora com 30 anos de carreira confessou-me, com os olhos marejados: 'Ensino há três décadas e nunca me senti tão desamparada. Os alunos chegam cada vez mais desmotivados, os pais estão ausentes, e nós, professores, somos tratados como números num sistema que só se preocupa com estatísticas.' Esta não é uma voz isolada. Em Lisboa, no Porto, em Coimbra, repetem-se histórias semelhantes - um cansaço que vai além do físico, um desgaste emocional que nenhuma formação contínua consegue reparar.

Enquanto o governo celebra a redução do abandono escolar precoce para 5,9%, o mais baixo de sempre, ninguém fala dos jovens que ficam pelo caminho. Na periferia de Setúbal, conheci o Miguel, 17 anos, que abandonou a escola no 10º ano. 'Os professores diziam que eu era inteligente, mas ninguém percebia que eu tinha de trabalhar à noite para ajudar em casa. Quando faltava às aulas por cansaço, era tratado como preguiçoso.' A sua história revela uma falha gritante no sistema: a incapacidade de adaptar-se às realidades socioeconómicas dos alunos. As políticas educativas, desenhadas em gabinetes com ar condicionado, falham redondamente quando confrontadas com a complexidade da vida real.

A obsessão pelos rankings transformou as escolas em fábricas de resultados. Na Escola Secundária de Braga, um diretor admitiu, sob condição de anonimato: 'Somos pressionados a melhorar os resultados a qualquer custo. Se um aluno tem más notas, sugerimos que mude de curso ou até de escola. O importante é que a nossa média suba.' Esta cultura do sucesso a qualquer preço está a criar gerações de alunos que sabem passar em exames, mas não sabem pensar criticamente, não sabem resolver problemas reais, não sabem ser cidadãos ativos.

A tecnologia, apresentada como a grande salvação, tornou-se num novo divisor social. Enquanto escolas privadas de Lisboa equipam todas as salas com quadros interativos e tablets de última geração, na Escola Básica de Miranda do Douro, os professores ainda lutam por um projector que funcione. 'Recebemos 20 computadores há três anos', contou-me uma professora. 'Ainda estão nas caixas porque não temos técnico para os instalar nem internet que os suporte.' Esta desigualdade digital está a criar duas educações paralelas: uma para quem pode pagar, outra para quem depende do Estado.

Mas há luzes no fim do túnel. Em Odemira, uma escola reinventou-se através de um projeto comunitário que envolve alunos, professores e população local. 'Transformámos um terreno baldio numa horta biológica', explicou-me a diretora, com orgulho nos olhos. 'Os alunos aprendem matemática a medir canteiros, biologia a observar as plantas, português a escrever sobre a experiência. E o melhor: os produtos são vendidos na feira local, revertendo o dinheiro para a escola.' Este projeto, simples mas revolucionário, mostra que é possível educar de forma diferente - quando se tem coragem para desafiar o estabelecido.

O maior desafio, porém, continua a ser a formação de professores. Um estudo recente do Observatório da Educação revelou que 40% dos docentes consideram a sua formação inicial inadequada para os desafios atuais. 'Saí da faculdade a saber analisar poemas de Camões, mas não sabia lidar com um aluno com ansiedade ou com pais agressivos', confessou-me uma jovem professora do Porto. A solução passa por uma reformulação radical dos cursos de Educação, focando menos na teoria e mais na prática, menos no conteúdo e mais nas pessoas.

No final da minha investigação, uma conclusão tornou-se evidente: Portugal precisa de parar de olhar para a educação como um conjunto de números a melhorar e começar a vê-la como aquilo que realmente é - o processo mais complexo e importante de qualquer sociedade. Enquanto medirmos o sucesso pelas médias dos exames, continuaremos a falhar o essencial: formar seres humanos completos, críticos, empáticos e preparados para um mundo em constante mudança. A verdadeira revolução educativa não se fará com mais tecnologia ou mais testes, mas com mais humanidade, mais escuta ativa, mais adaptação às realidades locais. O caminho é longo, mas as primeiras pedras já estão a ser colocadas - por professores, alunos e comunidades que recusam conformar-se com um sistema que já não serve o seu propósito.

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