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O que os dados não mostram: a educação portuguesa entre rankings e realidades

Nos últimos meses, os jornais encheram-se de manchetes sobre os resultados do PISA e os rankings das escolas. Os números saltam das páginas como verdades absolutas: Portugal subiu dois lugares em matemática, desceu um em leitura, a escola X é a melhor do distrito. Mas o que acontece quando fechamos os relatórios e entramos nas salas de aula? A história que os dados contam é apenas um capítulo – e talvez não seja o mais importante.

Nas traseiras de uma escola secundária de Lisboa, encontro a professora Carla, de 52 anos, enquanto fuma um cigarro à janela da sala dos professores. 'Ontem tive de explicar a um aluno do 10º ano como se soma 1/4 com 1/2', diz-me, com um sorriso cansado. 'No mesmo dia, a mesma turma discutia paradoxos temporais na física quântica.' Esta dualidade define o sistema educativo português: excelência convivendo com lacunas gritantes, tudo na mesma sala, nos mesmos 45 minutos.

Enquanto o Ministério da Educação anuncia mais tablets para as escolas, visitei três estabelecimentos onde os professores pagam do bolso o papel para as fotocópias. Na EB 2,3 de Vale de Cambra, a diretora mostra-me um armário com computadores comprados em 2008. 'Funcionam quando querem', comenta, enquanto tenta ligar um que emite um som agonizante. A tecnologia prometida como equalizadora torna-se mais um fator de desigualdade.

Mas há histórias que os rankings nunca capturam. Na Escola Básica de Monsanto, a professora Isabel criou um 'clube das emoções' onde os alunos aprendem a identificar o que sentem. 'Um miúdo que não consegue gerir a frustração não vai resolver equações', explica. Os resultados académicos da turma melhoraram 30% em dois anos, mas esse número não aparece em nenhum relatório oficial.

O verdadeiro drama desenrola-se nos corredores durante os intervalos. Os adolescentes dividem-se em tribos invisíveis: os que têm explicações pagas, os que estudam sozinhos, os que desistiram há muito. A socióloga Marta Silva, que acompanha cinco escolas há três anos, nota um padrão preocupante: 'A escola reproduz as desigualdades sociais com uma precisão quase matemática. O filho do médico e o filho da empregada de limpeza podem estar na mesma sala, mas não estão a receber a mesma educação.'

Nas reuniões de pais, o discurso também se divide. Enquanto uns perguntam sobre programas de enriquecimento curricular, outros querem saber se a escola fornece material básico. Esta fratura social reflete-se depois nos exames nacionais, mas as soluções propostas raramente abordam a raiz do problema. Investe-se em mais testes em vez de se investir em mais psicólogos escolares.

O fenómeno das explicações tornou-se uma indústria paralela ao sistema educativo. No bairro de Alvalade, em Lisboa, conto quinze centros de explicações num raio de 500 metros. 'É um seguro educativo', diz-me um pai enquanto espera a filha sair de uma aula de matemática que custa 25 euros à hora. 'Sabemos que a escola não chega.' Esta realidade cria dois sistemas dentro do mesmo: um público e gratuito, outro privado e pago.

Mas há luzes no fim do túnel. Em Braga, um grupo de professores criou um sistema de mentoria entre alunos. Os do secundário ajudam os do básico, criando redes de apoio que funcionam fora do horário escolar. 'Os resultados académicos melhoraram, sim', conta o coordenador do projeto, 'mas o mais importante foi verem-se como capazes de ajudar e de ser ajudados.'

A obsessão com os rankings esquece o essencial: a educação não é uma corrida, mas uma construção. Enquanto visitava uma escola em Setúbal, um aluno do 8º ano perguntou-me: 'O senhor acha que somos melhores ou piores do que os da Finlândia?' A pergunta revela como interiorizámos esta lógica de competição. Respondi com outra pergunta: 'E tu, sentes-te melhor ou pior aluno do que no ano passado?'

Os dados são importantes, mas são apenas mapas. A educação acontece no território – nas salas com tetos que pingam quando chove, nos professores que chegam às 7h30 e saem às 20h00, nos alunos que carregam mochilas mais pesadas do que deviam. Talvez seja tempo de olharmos menos para os números e mais para as pessoas. De medirmos menos o que os alunos sabem e mais como crescem. A verdadeira revolução educativa não virá de mais estatísticas, mas de mais humanidade.

Na próxima vez que ler um ranking, lembre-se: por trás de cada número há uma história. Por trás de cada percentil há um adolescente a tentar encontrar o seu lugar no mundo. E isso, nenhum teste consegue medir.

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