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O silêncio ensurdecedor das salas de aula: quando a educação portuguesa perdeu a voz

Há um segredo guardado a sete chaves nos corredores das escolas portuguesas, um segredo que nenhum relatório do Ministério da Educação menciona. Enquanto os números de aprovação sobem ano após ano, uma epidemia silenciosa consome as salas de aula: alunos que sabem responder a testes, mas que perderam a capacidade de fazer perguntas. Esta não é uma história sobre estatísticas ou políticas educativas - é sobre o desaparecimento gradual da curiosidade num sistema que privilegia respostas certas sobre questões inteligentes.

Nas últimas duas décadas, Portugal transformou-se num caso de estudo internacional pelo seu sucesso em melhorar resultados nos testes PISA. Mas por trás desses números brilhantes esconde-se uma realidade mais complexa. Visitei escolas desde o Algarve até ao Minho, e em cada uma encontrei a mesma contradição: professores exaustos a preparar alunos para exames que medem tudo menos o que realmente importa. "Ensino-os a navegar num mar de fórmulas", confessou-me uma professora de matemática do Porto, "mas não lhes dou tempo para aprenderem a construir barcos".

A obsessão com a avaliação padronizada criou uma geração de estudantes que são excelentes em seguir instruções, mas que tremem perante problemas sem solução pré-definida. Nas escolas técnicas, onde a criatividade deveria ser rainha, encontrei workshops de robótica onde os alunos montam kits seguindo manuais passo-a-passo, sem nunca questionarem por que os motores giram ou como os sensores funcionam. A educação transformou-se numa linha de montagem de competências, onde o produto final é um certificado, não uma mente inquieta.

Mas há focos de resistência. Numa escola básica em Évora, uma professora reformada voltou como voluntária para criar um "clube das perguntas proibidas" - um espaço onde os alunos podem questionar tudo, desde por que as folhas são verdes até como funcionam os algoritmos das redes sociais. Os resultados são surpreendentes: crianças que eram consideradas problemas de disciplina tornaram-se as mais participativas. "Eles não são hiperativos", explica a professora, "são apenas curiosos num sistema que penaliza a curiosidade".

O problema vai além das salas de aula. Os pais, pressionados por um mercado de trabalho cada vez mais competitivo, exigem que as escolas preparem os filhos para empregos que ainda não existem, sem perceberem que estão a pedir o impossível. Entrevistei dezenas de famílias e encontrei um padrão preocupante: a maioria valoriza mais as notas do filho no teste de ciências do que a sua capacidade de formular uma hipótese sobre porque é que o céu é azul.

Nas faculdades de educação, a situação não é melhor. Os futuros professores aprendem teorias pedagógicas sofisticadas, mas pouco sobre como acender a chama da curiosidade. Um estudante do último ano de uma licenciatura em ensino confessou-me: "Aprendi a planificar aulas perfeitas, mas ninguém me ensinou o que fazer quando um aluno faz uma pergunta para a qual não tenho resposta".

Há, no entanto, sinais de mudança. Algumas escolas começam a experimentar com "horários flexíveis", onde os alunos dedicam parte do dia a projetos da sua escolha. Numa escola em Coimbra, visitei uma sala onde adolescentes desenvolviam um jogo sobre a história local - aprendendo programação, design, história e trabalho em equipa sem sequer perceberem que estavam a "estudar". O diretor admitiu: "Temos mais visitas da inspeção do que gostaríamos, porque isto não se enquadra nos moldes tradicionais".

A verdade inconveniente é que estamos a educar crianças para um mundo que já não existe. Os empregos do futuro não vão exigir pessoas que sabem repetir informação, mas sim pessoas que sabem questioná-la. Portugal tem uma oportunidade única de liderar esta mudança, mas para isso precisa de coragem para questionar o próprio sistema que criou.

O maior perigo não é que os alunos portugueses saiam da escola sem saberem resolver equações - é que saiam sem saberem formular as questões certas. Enquanto continuarmos a medir o sucesso educativo pelo número de respostas certas, em vez de pela qualidade das perguntas, estaremos a preparar uma geração brilhantemente equipada para o século passado.

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