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O silêncio que ensina: quando as escolas portuguesas descobrem o poder da educação emocional

Há uma revolução silenciosa a acontecer nas salas de aula portuguesas, e não vem dos manuais escolares. Enquanto o debate público se concentra nos resultados do PISA e nas médias de exames, educadores visionários estão a introduzir algo radicalmente simples: o direito de as crianças sentirem.

Na Escola Básica de São Miguel, em Odemira, as manhãs começam de forma invulgar. Em vez do tradicional "Bom dia, professora", os alunos do 3º ano sentam-se em círculo e partilham como se sentem. "Hoje estou um pouco nervoso porque o meu cão está doente", confessa o Miguel, de 8 anos. A professora Ana Silva não corrige nem apressa. Apenas escuta. Esta prática, que poderia parecer marginal há uma década, está a espalhar-se por escolas de norte a sul do país, desafiando décadas de tradição educativa que privilegiava exclusivamente o cognitivo.

O que levou esta mudança? A resposta pode estar nos números que ninguém quer ver. Um estudo recente da Direção-Geral de Estatísticas da Educação revela que 34% dos alunos portugueses entre os 10 e os 15 anos reportam sintomas de ansiedade escolar. São crianças que dominam a tabuada mas tremem perante um teste, adolescentes que escrevem redações brilhantes mas não conseguem falar sobre o que os assusta.

"Educámos gerações inteiras para ter sucesso, mas esquecemo-nos de as educar para ser felizes", reflete Carlos Mendes, psicólogo escolar há 25 anos. "Estamos perante uma geração que sabe resolver equações de segundo grau mas não sabe gerir uma frustração."

Esta constatação está a levar a mudanças concretas. Em Braga, o Agrupamento de Escolas de Real implementou um programa pioneiro de literacia emocional que já reduziu os conflitos no recreio em 40%. Em Lisboa, a Escola Secundária de Camões introduziu espaços de silêncio onde os alunos podem recarregar energias entre aulas. São iniciativas que parecem simples, mas que representam uma mudança de paradigma profunda.

O desafio, contudo, é enorme. A formação de professores nesta área ainda é incipiente. Muitos educadores confessam sentir-se despreparados para lidar com a complexidade emocional dos seus alunos. "Fui formada para ensinar Matemática, não para ser terapeuta", admite uma professora do Porto que preferiu não se identificar.

A resistência também vem de alguns pais, que temem que estas práticas distraiam dos "conteúdos importantes". "Preocupo-me que a minha filha perca tempo a falar de sentimentos quando devia estar a estudar para os exames nacionais", confessa Maria João, mãe de uma aluna do 7º ano.

Mas os defensores da educação emocional argumentam com dados convincentes. Escolas que implementaram estes programas reportam não só melhor bem-estar dos alunos, mas também melhorias académicas. "Quando uma criança se sente segura e compreendida, a sua capacidade de aprendizagem dispara", explica Sofia Ramalho, especialista em neuroeducação.

O sucesso destas iniciativas depende de algo subtil: a capacidade dos adultos de reconhecerem as suas próprias emoções. "Não podemos ensinar o que não vivemos", reflete o professor Rui Costa, que após 30 anos de carreira decidiu formar-se em inteligência emocional. "A maior lição que aprendi foi que primeiro preciso de acalmar a minha própria ansiedade antes de poder ajudar os meus alunos."

Enquanto o Ministério da Educação debate a revisão curricular, estes educadores estão a escrever um novo capítulo da história do ensino português. Não através de decretos-lei, mas através de gestos simples: um abraço no momento certo, um ouvido atento, o reconhecimento de que por detrás de cada aluno há um ser humano completo.

O caminho é longo, mas os primeiros passos já foram dados. Nas palavras de uma aluna do 6º ano: "Antes achava que a escola era só para aprender matérias. Agora sei que também é para aprender a viver." Talvez esta seja, afinal, a lição mais importante de todas.

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