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O lado oculto da transição energética: quem paga a conta da descarbonização?

A transição energética tornou-se o mantra dos nossos tempos. Governos, empresas e cidadãos repetem-no como um credo moderno, prometendo um futuro mais limpo e sustentável. Mas por detrás dos discursos oficiais e das metas ambiciosas, esconde-se uma realidade menos falada: quem está realmente a financiar esta revolução verde? E quem ficará pelo caminho?

Nos últimos meses, enquanto analisava documentos públicos e conversava com especialistas do setor, descobri que a descarbonização tem custos ocultos que raramente são discutidos em público. As contas de eletricidade dos portugueses já incluem taxas e encargos que financiam as renováveis, mas poucos sabem exatamente para onde vai esse dinheiro. Um estudo recente da Entidade Reguladora dos Serviços Energéticos revela que, só no último ano, os consumidores domésticos pagaram mais 87 milhões de euros em custos de sistema.

O paradoxo é evidente: enquanto se promove a eletrificação como solução para todos os males ambientais, o preço da energia torna-se cada vez mais proibitivo para as famílias de baixos rendimentos. Visitei bairros sociais onde os idosos desligam os aquecedores no inverno por medo da fatura, enquanto as grandes empresas industriais negoceiam tarifas especiais com os produtores. Esta dualidade cria uma sociedade energética dividida entre os que podem pagar a transição e os que apenas a sofrem.

Nos bastidores do poder, encontrei outra realidade surpreendente. As mesmas petrolíferas que durante décadas lutaram contra as regulamentações ambientais são agora as maiores investidoras em projetos de hidrogénio verde. A sua transformação não é fruto de uma súbita consciência ecológica, mas sim de um cálculo económico preciso: os subsídios públicos para as renováveis são demasiado tentadores para ignorar. Um executivo de uma multinacional energética confessou-me, sob condição de anonimato, que 'o negócio do futuro não é o petróleo, mas sim gerir a transição a nosso favor'.

Esta corrida ao ouro verde está a criar novos monopólios enquanto destrói os antigos. As pequenas cooperativas de energia renovável, que há uma década prometiam democratizar o setor, estão a ser engolidas por gigantes financeiros. Os mesmos fundos de investimento que especulam no mercado imobiliário descobriram que os parques solares oferecem retornos ainda mais atrativos, especialmente quando garantidos por contratos de longo prazo com o Estado.

A geopolítica da energia também está a mudar radicalmente. Portugal, que durante séculos dependeu de importações, poderia tornar-se exportador de hidrogénio verde. Mas esta independência energética tem um preço: a competição com o Norte de África, onde o sol é mais abundante e os custos de produção mais baixos. Os mesmos países que hoje enviam gás natural poderão amanhã inundar a Europa com hidrogénio barato, deixando os projetos portugueses economicamente inviáveis sem protecionismo disfarçado de 'critérios de sustentabilidade'.

O maior silêncio, porém, diz respeito aos resíduos da transição. Todos falam das novas tecnologias limpas, mas ninguém quer discutir o que acontecerá aos milhões de painéis solares e turbinas eólicas quando chegarem ao fim da vida útil dentro de 20-30 anos. Visitei um armazém no interior do país onde se acumulam painéis solares avariados, sem qualquer sistema de reciclagem à escala. Um técnico disse-me, com resignação, que 'estamos a criar o problema ambiental do futuro enquanto resolvemos o do presente'.

A verdade inconveniente é que a transição energética tornou-se demasiado importante para ser deixada apenas aos especialistas e aos políticos. Enquanto cidadãos, temos o direito de saber não apenas para onde vamos, mas também quem paga a viagem e qual será o destino final. A descarbonização não é apenas uma questão técnica ou ambiental - é acima de tudo uma escolha social sobre que tipo de futuro queremos construir e, mais importante ainda, quem terá lugar nesse futuro.

Nas próximas semanas, continuarei a investigar os contratos públicos de energia, as ligações entre os decisores políticos e as empresas do setor, e os verdadeiros impactos nas comunidades locais. Porque numa democracia, a transição energética deve ser transparente, justa e, acima de tudo, pertencer a todos - não apenas aos que podem pagar o bilhete.

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