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O som esquecido: como a perda auditiva silenciosa está a moldar as nossas relações

Num café de Lisboa, observei um homem de meia-idade inclinar-se para a frente, o ouvido quase a tocar nos lábios da companheira. Os seus olhos estavam fixos, concentrados, como se tentasse decifrar um código através do ruído de fundo. Esta cena, cada vez mais comum nas nossas cidades, revela uma epidemia silenciosa que está a redefinir a forma como nos relacionamos.

A perda auditiva não é apenas sobre deixar de ouvir o chilrear dos pássaros ou as notas subtis de uma sinfonia. É sobre perder os matizes da comunicação humana - o suspiro de contentamento, o riso contido, o tom de preocupação que atravessa uma voz. Estudos recentes mostram que 40% dos portugueses acima dos 50 anos já experienciam algum grau de deficiência auditiva, mas menos de metade procura ajuda.

O que mais me surpreendeu na minha investigação foi como esta condição está a criar fracturas invisíveis nas famílias portuguesas. Maria, 68 anos, confessou-me: "Deixei de ir às reuniões de família. Todos falam ao mesmo tempo e eu só ouço um zumbido confuso. Sinto-me uma intrusa na minha própria vida". Esta solidão acústica é particularmente cruel porque acontece em ambientes socialmente ricos.

A tecnologia moderna trouxe soluções impressionantes, mas também novos desafios. Os aparelhos auditivos digitais de última geração são pequenas maravilhas da engenharia, capazes de filtrar ruído de fundo e amplificar precisamente as frequências da fala humana. No entanto, o estigma persiste. Muitos ainda associam estes dispositivos à velhice, ignorando que cada vez mais jovens precisam deles devido à exposição constante a volumes elevados.

Um audiologista no Porto partilhou comigo um dado alarmante: "Atendemos cada vez mais pessoas na casa dos 30 anos com perda auditiva precoce. Os headphones, os concertos, o ambiente urbano constante - tudo contribui para um desgaste acelerado".

A relação entre audição e saúde mental é outra faceta subestimada desta questão. A dificuldade em acompanhar conversas leva ao isolamento, que por sua vez aumenta o risco de depressão e declínio cognitivo. É um ciclo vicioso que poucos reconhecem até estarem profundamente dentro dele.

As soluções passam não apenas pela tecnologia, mas por uma mudança cultural. Precisamos normalizar os check-ups auditivos como fazemos com a visão. Precisamos de espaços públicos com melhor acústica. Precisamos, sobretudo, de aprender a comunicar de forma mais inclusiva - falando pausadamente, de frente para o interlocutor, num tom claro.

O som do silêncio pode ser poético na literatura, mas na vida real, o silêncio involuntário é uma prisão. À medida que investigava este tema, percebi que restaurar a audição é mais do que um acto médico - é devolver às pessoas a sua place na tapeçaria sonora da vida humana.

Na próxima vez que estiver numa conversa, repare: quantos nuances está a perder? Quantas conexões se desvanecem no ruído? A resposta pode surpreendê-lo - e talvez incentive-o a proteger melhor esse sentido milagroso que tantos dão como garantido.

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