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O som esquecido: como a perda auditiva silenciosa está a transformar vidas em Portugal

Há um som que se perde gradualmente, quase sem que nos apercebamos. É o tilintar das chaves no bolso, o sussurro das folhas ao vento, o riso contido numa conversa íntima. Em Portugal, milhares de pessoas estão a perder estes sons sem sequer darem por isso. A perda auditiva tornou-se numa epidemia silenciosa que afecta não apenas a capacidade de ouvir, mas a própria essência das relações humanas.

A realidade é alarmante: segundo dados recentes, cerca de 30% dos portugueses com mais de 50 anos sofrem de algum grau de perda auditiva. O que mais preocupa os especialistas é que a maioria demora em média sete anos a procurar ajuda. Sete anos de conversas mal compreendidas, de televisões com volume máximo, de isolamento social progressivo. Durante este período, o cérebro vai-se adaptando à nova realidade, criando estratégias compensatórias que mascaram o problema.

O fenómeno não afecta apenas os mais velhos. Cada vez mais jovens chegam às consultas de audiologia com queixas relacionadas com a exposição a ruído. Os auscultadores, os concertos, os ambientes profissionais ruidosos – tudo contribui para um envelhecimento precoce do sistema auditivo. Um estudo realizado em Lisboa revelou que 15% dos jovens entre os 18 e os 25 anos já apresentam sinais de perda auditiva induzida por ruído.

A tecnologia moderna trouxe soluções que parecem saídas de ficção científica. Os aparelhos auditivos de hoje são mini-computadores que se adaptam automaticamente a diferentes ambientes sonoros. Conseguem filtrar o ruído de fundo, amplificar a fala e até conectar-se directamente com telemóveis e televisões. No entanto, o estigma persiste. Muitos ainda associam estes dispositivos à velhice ou à incapacidade, ignorando que são ferramentas de inclusão social.

A relação entre audição e cognição é mais forte do que se pensava. Investigadores portugueses descobriram que a perda auditiva não tratada acelera o declínio cognitivo. O cérebro, ao esforçar-se constantemente para decifrar sons incompletos, tem menos recursos disponíveis para outras funções. Esta descoberta transformou completamente a abordagem clínica: já não se trata apenas de melhorar a audição, mas de preservar a saúde cerebral.

O sistema nacional de saúde português oferece algum apoio, mas as listas de espera são longas e a comparticipação limitada. Muitos portugueses acabam por recorrer ao sector privado, onde os preços podem chegar aos milhares de euros. Esta realidade cria uma barreira económica que exclui precisamente quem mais precisa – os reformados com pensões baixas, os desempregados, as famílias com dificuldades financeiras.

As consequências sociais são profundas. Maria, uma professora reformada de 68 anos, conta-nos como a sua vida mudou: "Deixei de ir a jantares com amigos porque não conseguia acompanhar as conversas. Sentia-me uma intrusa, sempre a pedir para repetirem o que diziam. Aos poucos, fiquei em casa." Histórias como a de Maria repetem-se por todo o país, criando uma rede invisível de isolamento.

A prevenção continua a ser a melhor arma. Especialistas recomendam exames auditivos regulares, protecção em ambientes ruidosos e períodos de descanso acústico. No entanto, a consciencialização ainda é baixa. Poucos sabem que a exposição a 85 decibéis durante oito horas pode causar danos permanentes – o equivalente ao ruído do trânsito citadino.

As soluções passam por uma abordagem integrada. É necessário investir em campanhas de sensibilização, melhorar o acesso aos cuidados de saúde auditiva e combater o estigma associado aos aparelhos. Algumas empresas começam a incluir rastreios auditivos nos exames de saúde ocupacional, reconhecendo que a audição é um capital precioso.

O futuro traz esperança. Investigadores portugueses estão a desenvolver novas tecnologias, desde aparelhos mais discretos até terapias genéticas para certos tipos de surdez. Enquanto isso, cada um de nós pode fazer a diferença: falando mais devagar, olhando para a pessoa com quem conversamos, criando ambientes acusticamente favoráveis.

No final, trata-se de reconhecer que a audição não é apenas um sentido – é a ponte que nos liga aos outros, à música, à natureza, à vida. Preservá-la é preservar a nossa humanidade. Como diz o velho provérbio: "Quem ouve mal, responde pior." Talvez seja hora de começarmos a ouvir melhor – uns aos outros e aos sinais que o nosso corpo nos envia.

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