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A revolução silenciosa do hidrogénio verde em Portugal: o que os grandes meios não contam

Enquanto os holofotes mediáticos se concentram nos painéis solares que pontuam cada vez mais telhados portugueses, uma revolução energética muito mais profunda está a acontecer nos bastidores. O hidrogénio verde, esse parente pobre da cobertura jornalística sobre energias renováveis, prepara-se para transformar radicalmente a matriz energética nacional, e poucos parecem dar pela mudança.

Nos últimos meses, enquanto os portugueses discutiam o preço da luz e o custo dos combustíveis, um consórcio liderado pela EDP e Galp avançava silenciosamente com o projeto de 900 milhões de euros para produzir hidrogénio verde em Sines. A fábrica, que deverá entrar em funcionamento em 2025, será uma das maiores da Europa e colocará Portugal no mapa global desta tecnologia emergente. Mas porque é que esta notícia passou quase despercebida?

A resposta pode estar na complexidade técnica que envolve o hidrogénio verde. Enquanto a energia solar é intuitiva - o sol brilha, os painéis captam, a eletricidade flui - o hidrogénio verde exige uma explicação mais elaborada. Produzido através da eletrólise da água usando eletricidade renovável, este gás pode armazenar energia durante meses e alimentar desde fábricas a navios de carga, algo que as baterias convencionais ainda não conseguem fazer a escala industrial.

O potencial económico é avassalador. Portugal tem condições únicas para se tornar exportador de hidrogénio verde: sol em abundância, vento consistente e uma posição geográfica privilegiada junto às rotas marítimas internacionais. Os números falam por si: estima-se que o setor possa gerar 12 mil milhões de euros em investimentos até 2030 e criar mais de 25 mil postos de trabalho qualificados. No entanto, estas projeções raramente chegam às primeiras páginas.

Mas há desafios que a narrativa otimista tende a esconder. O custo de produção do hidrogénio verde continua a ser significativamente superior ao do hidrogénio cinzento (produzido a partir de gás natural). A infraestrutura de transporte e armazenamento praticamente não existe, e a escassez de água em certas regiões do país pode limitar a expansão desta tecnologia. São estas complexidades que tornam a história do hidrogénio verde muito mais interessante - e muito menos linear - do que a simples instalação de painéis solares.

O que está em jogo vai muito além da transição energética. O hidrogénio verde representa uma oportunidade única para Portugal reposicionar-se na cadeia de valor global. Em vez de exportarmos eletricidade barata para depois importarmos tecnologia cara, podemos desenvolver conhecimento local e criar uma indústria de ponta. Já há startups portuguesas a desenvolver eletrolisadores mais eficientes e centros de investigação a trabalhar em métodos de produção inovadores.

Os sinais de que algo grande está a acontecer multiplicam-se se soubermos onde procurar. A Navigator anunciou recentemente que vai usar hidrogénio verde na sua fábrica de papel em Setúbal. A Auto Sueco está a testar camiões movidos a hidrogénio. Até a indústria do vinho começa a explorar esta tecnologia para reduzir a pegada carbónica das suas operações. São pequenas revoluções setoriais que, no seu conjunto, desenham um futuro energético radicalmente diferente.

O maior obstáculo pode não ser técnico nem económico, mas sim de comunicação. Enquanto não conseguirmos contar a história do hidrogénio verde de forma acessível e emocionante, continuará a ser visto como um tema para especialistas. A verdade é que esta tecnologia afectará todos os portugueses - do preço dos produtos que compram às oportunidades de emprego dos seus filhos.

Nos próximos anos, assistiremos a uma batalha silenciosa entre diferentes visões para o futuro energético português. De um lado, os que defendem uma aposta agressiva no hidrogénio verde como vector de desenvolvimento industrial. Do outro, os que preferem focar-se na eletrificação direta através de solar e eólico. A resposta provavelmente estará no meio, mas o debate precisa de acontecer de forma mais transparente e inclusiva.

O que está em causa não é apenas como produzimos energia, mas que tipo de país queremos ser na próxima década. Um mero exportador de eletricidade renovável ou um centro de inovação tecnológica? Um consumidor de soluções energéticas desenvolvidas noutros países ou um criador de conhecimento exportável? O hidrogénio verde pode ser a chave para esta transformação, mas primeiro temos de aprender a falar sobre ele.

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