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A guerra silenciosa pelas nossas antenas: como as operadoras estão a mudar a paisagem das telecomunicações

Há uma revolução a acontecer nos telhados e nos campos de Portugal, mas poucos lhe prestam atenção. Enquanto discutimos a velocidade da internet ou o preço dos pacotes, as operadoras de telecomunicações travam uma batalha subtil pelo controlo da infraestrutura física que sustenta o nosso mundo digital. Esta não é apenas uma história sobre tecnologia – é sobre poder, estratégia e o futuro da conectividade no país.

Nas últimas semanas, documentos internos obtidos pelo Observador revelam que a Altice Portugal está a acelerar a instalação de pequenas células 5G em zonas urbanas, muitas vezes sem o conhecimento explícito das autarquias. Estas micro-antenas, disfarçadas em postes de iluminação ou mobiliário urbano, prometem melhor cobertura, mas levantam questões sobre transparência e governação do espaço público. Um técnico municipal de Lisboa, que pediu anonimato, confessou: "Às vezes descobrimos os equipamentos já instalados. É como se o território fosse sendo ocupado silenciosamente."

Paralelamente, a Vodafone e a NOS investem fortemente em fibra ótica em zonas rurais, num movimento que o Público descreveu como "a reconquista digital do interior". O plano parece nobre – levar internet de alta velocidade a aldeias esquecidas – mas esconde uma estratégia comercial agressiva. As operadoras negoceiam acordos exclusivos com juntas de freguesia, criando monopólios locais que depois dificultam a entrada da concorrência. Em Trás-os-Montes, três aldeias têm hoje apenas uma opção de fornecedor, situação que especialistas consideram preocupante para a liberdade de escolha dos consumidores.

O DN destaca outro frente desta guerra: a batalha judicial. Nos tribunais administrativos, multiplicam-se os processos sobre a instalação de antenas de grande dimensão. As operadoras argumentam necessidade técnica e interesse público, enquanto as associações de moradores falam em poluição visual e possíveis riscos para a saúde. Um caso em Oeiras tornou-se emblemático – depois de dois anos de litígio, o município foi obrigado a autorizar uma estrutura de 45 metros, contra a vontade expressa da população local. "A lei está do lado deles", lamenta um morador. "Temos cada vez menos voz sobre o que aparece na nossa paisagem."

A tecnologia, contudo, não para. A Tek Sapo revelou que a Meo está a testar em Coimbra um sistema pioneiro de antenas reconfiguráveis por software. Estas estruturas inteligentes podem alterar o seu padrão de emissão conforme a necessidade, optimizando o sinal em horas de ponta ou durante eventos especiais. A inovação é impressionante, mas especialistas em privacidade alertam: a mesma tecnologia que direcciona o sinal pode, teoricamente, ser usada para monitorizar movimentos de pessoas com precisão alarmante.

O Expresso trouxe à luz um aspecto frequentemente ignorado desta transformação: o impacto ambiental. Cada nova geração de rede consome mais energia – o 5G requer até três vezes mais electricidade que o 4G para cobrir a mesma área. Perante a crise energética, as operadoras procuram soluções criativas, desde painéis solares nas próprias antenas até acordos com parques eólicos. Mas a verdade é que a nossa sede por dados tem um custo ecológico crescente, que raramente entra nas campanhas publicitárias sobre velocidade e inovação.

No meio desta complexa teia de interesses, o cidadão comum enfrenta um dilema. Queremos melhor cobertura, mais velocidade, preços mais baixos – mas a que custo? A democratização do acesso à internet colide com a privatização do espaço público. O progresso tecnológico esbarra em preocupações ambientais. A conveniência individual confronta-se com o bem comum.

Investigadores da Universidade do Porto alertam para o que chamam de "arquitetura da dependência". À medida que as operadoras controlam mais infraestrutura crítica, tornamo-nos mais vulneráveis às suas decisões estratégicas. Um apagão numa central da Altice, em 2021, deixou sem comunicações uma faixa significativa do litoral norte durante horas – um prenúncio do que pode acontecer quando poucos players dominam o essencial.

O futuro desenha-se agora nas reuniões de administração e nas negociações com o regulador. As operadoras preparam-se para o 6G, enquanto tentam rentabilizar os investimentos no 5G. As autarquias procuram recuperar algum controlo sobre o seu território. Os consumidores exigem melhores serviços a preços justos. Nesta equação complexa, uma coisa é certa: as antenas que hoje instalamos definirão não apenas a qualidade da nossa internet, mas o modelo de sociedade digital que herdaremos.

A guerra pelas nossas antenas continua, silenciosa mas determinante. E todos nós, cada vez que fazemos uma chamada ou carregamos um vídeo, somos ao mesmo tempo beneficiários e reféns do seu desfecho.

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