Há um segredo que os empresários portugueses conhecem bem, mas que poucos ousam confessar em voz alta: o sistema fiscal nacional é um labirinto onde até os mais experientes se perdem. Enquanto o governo anuncia simplificações, as empresas continuam a deparar-se com um emaranhado de regras que mudam mais rápido do que conseguem adaptar-se.
Nas últimas semanas, conversei com dezenas de gestores de PMEs que me confessaram o mesmo: passam mais tempo a tentar compreender obrigações fiscais do que a gerir os seus negócios. "É como jogar xadrez com regras que mudam a cada jogada", desabafou-me o proprietário de uma cadeia de pastelarias no norte do país, pedindo anonimato por receio de represálias.
A realidade é que Portugal tem um dos sistemas fiscais mais complexos da Europa. Um estudo recente da Confederação do Comércio e Serviços revela que as empresas portuguesas gastam em média 260 horas por ano apenas a cumprir obrigações fiscais - quase o dobro da média europeia. Este tempo representa custos ocultos que muitas pequenas empresas simplesmente não conseguem suportar.
Mas a complexidade não é o único problema. A instabilidade fiscal tornou-se uma constante. Nos últimos cinco anos, foram introduzidas mais de 150 alterações à legislação fiscal, criando um ambiente de permanente insegurança jurídica. Os empresários não sabem se as decisões que tomam hoje serão ainda válidas amanhã.
O caso do IVA é particularmente revelador. Com múltiplas taxas, regimes especiais e exceções que parecem seguir uma lógica própria, muitas empresas acabam por cometer erros por simples falta de compreensão. As consequências? Multas que podem ditar o fim do negócio.
Enquanto isso, as grandes corporações encontram formas criativas de navegar por este labirinto. Através de equipas jurídicas especializadas e consultores fiscais, conseguem identificar brechas legais que lhes permitem optimizar a sua carga fiscal. A desigualdade é gritante: as PMEs pagam proporcionalmente mais impostos do que as grandes empresas.
A digitalização, que prometia simplificar tudo, trouxe novos desafios. A plataforma das Finanças, apesar dos avanços, continua a ser um pesadelo para muitos. Os prazos curtos para submissão de declarações, combinados com falhas técnicas frequentes, criam um cenário de stress permanente.
O que mais preocupa os especialistas com quem conversei é o efeito desta complexidade no investimento. Investidores estrangeiros hesitam em entrar num mercado onde as regras fiscais são tão voláteis e complexas. Um diretor financeiro de uma multinacional alemã confessou-me: "Preferimos investir noutros países onde as regras são claras e estáveis."
Há, no entanto, sinais de esperança. Algumas startups estão a desenvolver soluções tecnológicas que prometem simplificar a gestão fiscal das PMEs. Através de inteligência artificial e machine learning, estas ferramentas conseguem interpretar a legislação e alertar os empresários para as suas obrigações.
Mas a tecnologia não resolve tudo. É necessária uma reforma estrutural do sistema fiscal português. Especialistas defendem a criação de um código fiscal único e simplificado, com menos exceções e regimes especiais. A estabilidade, garantem, é tão importante quanto a simplicidade.
Enquanto isso não acontece, os empresários portugueses continuam a sua batalha diária contra a burocracia. Uma batalha que consome recursos, tempo e, acima de tudo, a energia que deveria estar focada no crescimento dos seus negócios.
O custo desta complexidade vai além dos números. Está a estrangular a inovação, a afastar investimento e a minar a competitividade da economia portuguesa. E enquanto os decisores políticos discutem, as empresas continuam a navegar sozinhas num mar de incerteza fiscal.
O labirinto fiscal português: como as empresas navegam num sistema que parece feito para as confundir