Os portugueses estão a pagar cada vez mais pelos seguros, mas poucos entendem realmente o que está por trás destes aumentos. Enquanto as seguradoras apontam para os riscos climáticos e a inflação, uma investigação mais aprofundada revela um cenário mais complexo – e preocupante.
Nos últimos dois anos, os prémios de seguros automóvel subiram em média 15%, enquanto os seguros de saúde registaram aumentos superiores a 20%. Estes números, por si só alarmantes, escondem realidades ainda mais duras para certos grupos. Condutores jovens, por exemplo, chegam a pagar três vezes mais pelo mesmo seguro que um condutor experiente, mesmo sem histórico de acidentes.
A verdade é que o mercado segurador português opera num equilíbrio delicado. Por um lado, as seguradoras enfrentam custos crescentes com sinistros, especialmente devido aos fenómenos climáticos extremos que têm assolado o país. As tempestades de inverno e os incêndios florestais de verão tornaram-se eventos quase certos no calendário anual, com prejuízos que se contam em centenas de milhões de euros.
No entanto, há factores menos visíveis a influenciar estes preços. A concentração do mercado é um deles – as três maiores seguradoras controlam mais de 60% do mercado português, limitando a concorrência real. Enquanto isso, as seguradoras mais pequenas lutam para sobreviver, muitas vezes especializando-se em nichos específicos onde podem oferecer preços mais competitivos.
Outro aspecto frequentemente ignorado é o papel dos mediadores de seguros. Estes intermediários, essenciais para muitas operações, recebem comissões que podem chegar aos 20% do valor do prémio. Estas comissões são naturalmente incorporadas nos preços finais, mas raramente são transparentes para o consumidor final.
A digitalização trouxe novas oportunidades, mas também novos desafios. As insurtechs – startups tecnológicas focadas em seguros – prometem preços mais baixos através da automatização, mas a sua penetração no mercado português ainda é limitada. A relutância dos consumidores em confiar em plataformas totalmente digitais e a complexidade regulatória travam esta evolução.
Um dos segredos melhor guardados da indústria é a forma como as seguradoras investem os prémios que recebem. Estes fundos são aplicados em diversos instrumentos financeiros, desde obrigações do Estado a investimentos imobiliários. Os retornos destes investimentos deveriam, em teoria, ajudar a baixar os prémios, mas na prática os benefícios raramente chegam ao consumidor final.
A regulação é outro ponto crítico. A ASF (Autoridade de Supervisão de Seguros e Fundos de Pensões) tem um papel fundamental na proteção dos consumidores, mas os seus recursos são limitados face à complexidade do sector. As fiscalizações são poucas e as coimas, quando aplicadas, representam frequentemente uma pequena fração dos lucros das seguradoras.
Para o consumidor comum, navegar neste labirinto de preços e condições pode ser desanimador. A falta de transparência nas apólices, a linguagem técnica incompreensível para leigos e a dificuldade em comparar ofertas diferentes criam barreiras que beneficiam as seguradoras em detrimento dos segurados.
No entanto, há esperança no horizonte. A União Europeia está a trabalhar em directivas que poderão trazer maior harmonização e transparência ao mercado. Em Portugal, associações de consumidores têm sido mais proativas na denúncia de práticas abusivas.
O futuro dos seguros em Portugal dependerá em grande medida da capacidade de inovação do sector e da pressão regulatória para maior transparência. Os consumidores, por seu lado, precisam de se informar melhor e exigir clareza nas condições que lhes são oferecidas.
Enquanto isso, continuaremos a pagar preços que reflectem não apenas os riscos reais, mas também as ineficiências e assimetrias de um mercado que ainda tem muito para evoluir. A questão que fica no ar é: até quando?
Seguros em Portugal: o que as seguradoras não contam sobre os preços que pagamos
