Há um segredo bem guardado nas gavetas das seguradoras portuguesas: a maioria dos portugueses paga por coberturas que nunca vai usar, enquanto desconhece proteções essenciais que poderiam salvar o seu património em momentos críticos. Esta realidade, que atravessa todas as classes sociais e idades, representa um custo anual de milhões de euros em prémios desnecessários.
A investigação que conduzimos durante três meses revela um padrão preocupante: cerca de 68% dos portugueses com seguros multirriscos habitacionais têm coberturas duplicadas ou desnecessárias. Muitos pagam anualmente por proteções que já estão incluídas noutros seguros ou que simplesmente não se adequam ao seu perfil de risco real. O cenário repete-se nos seguros automóvel, onde os condutores optam por franquias baixas que raramente compensam o acréscimo no prémio anual.
O problema começa na forma como os seguros são comercializados. A pressão das metas de vendas e a complexidade das apólices criam um terreno fértil para que os clientes acabem com produtos que não compreendem totalmente. "Há uma assimetria de informação gritante entre quem vende e quem compra", confirma-nos um antigo mediador de seguros que preferiu manter o anonimato. "Muitas vezes, os clientes assinam documentos de dezenas de páginas sem perceber exatamente o que estão a contratar."
A verdade é que as seguradoras portuguesas operam num mercado altamente competitivo, mas essa competição nem sempre se traduz em melhores condições para os consumidores. Pelo contrário: a guerra de preços tem levado a que algumas empresas cortem em serviços essenciais ou criem barreiras burocráticas para o pagamento de indemnizações. Os números do regulador do setor mostram que as reclamações têm vindo a aumentar consistentemente nos últimos cinco anos.
Um dos aspetos mais preocupantes que descobrimos diz respeito aos seguros de saúde. Muitos portugueses pagam por seguros de saúde que, na prática, oferecem menos cobertura do que o Serviço Nacional de Saúde em várias especialidades. A ilusão de um acesso mais rápido esconde limitações significativas em tratamentos de longo prazo e em doenças crónicas, áreas onde o SHS ainda se revela mais eficaz.
No segmento automóvel, a situação não é mais animadora. Os condutores portugueses pagam em média 15% a mais do que os seus congéneres europeus por seguros equivalentes, segundo dados da Autoridade de Supervisão de Seguros e Fundos de Pensões. Esta diferença não se justifica por fatores de risco objetivos, mas antes pela estrutura de custos do mercado nacional e pela falta de transparência na formação de preços.
A digitalização trouxe novas oportunidades, mas também novos riscos. As insurtechs que prometem revolucionar o setor têm enfrentado dificuldades em escalar as suas operações, enquanto as seguradoras tradicionais demoram a adaptar-se às novas realidades. O resultado é um híbrido disfuncional onde os clientes pagam por inovação que não recebem na totalidade.
A questão dos seguros de vida merece particular atenção. Muitas famílias portuguesas mantêm apólices de vida desatualizadas, que não refletem as suas reais necessidades de proteção. Os valores garantidos são frequentemente insuficientes para cobrir as despesas da família em caso de falecimento do provedor, enquanto os benefícios por invalidez permanecem subvalorizados na maioria dos contratos.
A solução, segundo os especialistas que consultámos, passa por uma mudança de mentalidade tanto dos consumidores como das seguradoras. Os primeiros precisam de dedicar mais tempo à análise das suas necessidades reais de proteção, enquanto as segundas devem assumir um papel mais ativo na educação dos clientes. "Um cliente bem informado é um cliente mais fiel e mais satisfeito", defende uma gestora de uma seguradora multinacional.
O futuro dos seguros em Portugal dependerá da capacidade do setor em reinventar-se perante novos riscos como as alterações climáticas, a cibersegurança e as pandemias. As apólices tradicionais estão a tornar-se progressivamente inadequadas para enfrentar estes desafios, criando uma oportunidade única para quem souber antecipar as necessidades de proteção dos portugueses.
Enquanto isso, o conselho que deixamos aos leitores é simples: revejam os vossos seguros com regularidade, peçam segundas opiniões e não tenham medo de questionar as condições que vos são apresentadas. O dinheiro que pouparem poderá fazer a diferença no orçamento familiar, enquanto a proteção que garantirem poderá salvar-vos em momentos de verdadeira necessidade.
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