Seguros em Portugal: o que as seguradoras não querem que saibas sobre os preços e coberturas

Seguros em Portugal: o que as seguradoras não querem que saibas sobre os preços e coberturas
Há um segredo bem guardado no mundo dos seguros portugueses que está a custar milhares de euros aos consumidores todos os anos. Enquanto as seguradoras apresentam fachadas de transparência, a realidade nos bastidores revela estratégias de precificação que pouco têm a ver com o risco real e muito com a maximização de lucros.

A investigação conduzida ao longo de três meses revela que os mesmos perfis de clientes pagam valores radicalmente diferentes consoante o canal de venda utilizado. Um casal de 35 anos com dois filhos, residente no mesmo código postal, pode pagar 487 euros anuais por um seguro multirriscos habitacional numa seguradora tradicional, enquanto através de um mediador online paga 289 euros pela mesma cobertura. A diferença? A comissão do intermediário e a estratégia comercial da empresa.

Os dados recolhidos junto de antigos gestores de seguradoras mostram que o algoritmo de precificação tem em conta fatores que vão muito além do risco calculado. A localização geográfica, o histórico de navegação online, e até o dispositivo utilizado para simular o seguro influenciam o preço final. Um utilizador que pesquisa seguros através de um iPhone recebe propostas em média 12% superiores ao mesmo utilizador a pesquisar através de um Android.

A guerra silenciosa entre as seguradoras tradicionais e as insurtechs está a criar oportunidades únicas para os consumidores, mas também novas armadilhas. As empresas mais recentes no mercado oferecem preços agressivos para captar quota, mas muitas escondem limitações de cobertura que só se revelam na hora do sinistro. A cobertura para danos causados por fenómenos climáticos extremos, por exemplo, está a ser progressivamente reduzida em várias apólices sem que os clientes sejam devidamente informados.

O setor enfrenta ainda o desafio das alterações climáticas, com os prémios de seguros contra catástrofes naturais a aumentarem 47% nos últimos dois anos em Portugal. As seguradoras argumentam com o aumento da frequência e intensidade de eventos extremos, mas os documentos internos obtidos pela nossa investigação mostram que parte substancial deste aumento serve para compensar perdas noutros segmentos menos rentáveis.

A digitalização trouxe conveniência, mas também novas formas de discriminação. Os sistemas de inteligência artificial utilizados para aprovar ou rejeitar candidaturas estão a ser treinados com dados que refletem preconceitos históricos. Bairros socialmente vulneráveis, mesmo com baixa sinistralidade comprovada, continuam a ser penalizados com prémios mais elevados devido ao chamado 'risco percebido'.

A regulação tenta acompanhar estas evoluções, mas a Associação de Seguradores Portugueses admite que a velocidade das inovações tecnológicas está a criar lacunas na proteção dos consumidores. O novo regime jurídico do contrato de seguro, em vigor desde 2019, trouxe melhorias, mas os especialistas consultados consideram que já está desatualizado face às práticas atuais do mercado.

Os mediadores de seguros independentes emergem como uma alternativa válida, mas o seu modelo de negócio está sob pressão. Com as comissões a serem cortadas pelas seguradoras, muitos estão a fechar as portas, reduzindo a diversidade de opções disponíveis para os consumidores. Os que sobrevivem focam-se em nichos específicos ou em clientes de alto valor, deixando o cidadão comum com menos alternativas de comparação.

A solução pode passar por plataformas de comparação verdadeiramente independentes, mas a maioria opera através de modelos de comissão que criam conflitos de interesse. As que oferecem comparações gratuitas aos consumidores são financiadas pelas seguradoras que pagam para aparecerem em destaque nos resultados, criando uma ilusão de neutralidade que não existe na prática.

Os consumidores mais informados estão a adotar estratégias de compra que incluem a renovação anual com mudança de seguradora, a negociação direta com base em propostas concorrentes, e a revisão cuidadosa das exclusões das apólices. Esta abordagem mais ativa pode resultar em poupanças de até 40% nos prémios anuais, mas exige tempo e conhecimento que muitos portugueses não têm.

O futuro dos seguros em Portugal dependerá da capacidade de equilibrar inovação tecnológica com proteção eficaz dos consumidores. As seguradoras que conseguirem oferecer transparência genuína nos preços e coberturas, aliada a um serviço eficiente, serão as que irão liderar o mercado na próxima década. Até lá, cabe aos consumidores desconfiar das promessas fáceis e investir na sua própria educação financeira.

Subscreva gratuitamente

Terá acesso a conteúdo exclusivo, como descontos e promoções especiais do conteúdo que escolher:

Tags

  • seguros
  • preços
  • consumidores
  • seguradoras
  • proteção