Num apartamento lisboeta, a bióloga Mariana Silva observa o seu dragão-barbudo, Zeus, a aquecer-se sob a lâmpada de calor. Enquanto ajusta o termóstato do terrário, confessa-me algo que surpreende: "Há dois anos, o Zeus precisou de uma cirurgia de emergência por impactação intestinal. A conta do veterinário especializado foi superior a 800 euros. Na altura, não existia nenhum seguro que cobrisse répteis em Portugal."
Esta realidade está a mudar, mas lentamente. Enquanto os seguros para cães e gatos se tornaram quase banais nos últimos cinco anos, os animais exóticos - répteis, aves, roedores, anfíbios e até invertebrados - continuam numa espécie de limbo segurador. Uma investigação por clínicas veterinárias especializadas em Lisboa, Porto e Faro revela que 68% dos donos de animais exóticos já enfrentaram despesas médicas inesperadas superiores a 500 euros.
"O problema começa na perceção de risco", explica-me o Dr. Ricardo Mendes, veterinário especializado em animais exóticos com clínica no Porto. "As seguradoras tradicionais ainda veem estes animais como 'nichos de risco' porque não têm dados históricos suficientes. Mas a verdade é que um periquito pode viver 15 anos, um furão até 10, e uma iguana mais de 20. São compromissos de longo prazo que merecem proteção."
A matemática é implacável: uma consulta de urgência para um hamster com problemas dentários pode custar 120 euros. Uma cirurgia para remover ovos retidos numa fêmea de lagarto pode ultrapassar os 600 euros. E o tratamento de uma doença respiratória num coelho, que é mais comum do que se imagina, facilmente atinge os 400 euros em medicamentos e terapias.
Nos bastidores das seguradoras, encontro resistência e inovação em doses iguais. "Desenvolvemos o primeiro seguro para animais exóticos em Portugal há apenas oito meses", conta-me Ana Lopes, subdirectora de produtos numa seguradora que prefere não identificar. "Tivemos de criar parcerias com veterinários especializados para entender os riscos reais. Descobrimos que, contrariamente ao mito, muitos destes animais têm menos problemas hereditários do que algumas raças de cães."
Mas as exclusões são numerosas. A maioria dos seguros não cobre animais adquiridos já com problemas de saúde, nem espécies consideradas perigosas ou em vias de extinção. Alguns excluem explicitamente invertebrados como tarântulas ou escorpiões. Outros limitam a cobertura a animais com microchip ou registo legal - algo que, para um rato-doméstico ou um canário, parece quase surreal.
A solução pode estar nos seguros personalizados. Em Barcelona, uma startup criou um modelo onde o prémio mensal varia conforme a espécie, idade e até o habitat criado pelo dono. Um coelho com acesso a espaço exterior paga mais do que um que vive apenas dentro de casa. Uma cobra com terrário termorregulado tem melhor cotação do que uma em condições básicas.
"O futuro passa pela educação", defende Sofia Martins, fundadora de uma associação de proteção de animais exóticos. "Muitos problemas de saúde surgem de cuidados inadequados. Se as seguradoras oferecessem descontos a donos que frequentam workshops sobre cuidados específicos, todos ganhavam: os animais teriam melhor saúde, as seguradoras teriam menos sinistros, e os donos pagariam menos."
Nas feiras de animais exóticos que visitei - discretamente, com caderno na mão - encontro histórias que ilustram esta necessidade urgente. Carlos, dono de duas calopsitas, mostra-me a factura de 300 euros por uma cirurgia de asa. "Comprei-as por 50 euros cada. Nunca imaginei que os custos médicos fossem seis vezes superiores ao preço de compra."
A legislação portuguesa começa a acordar para esta realidade. Um projecto-lei em discussão na Assembleia da República propõe que todos os animais de companhia, independentemente da espécie, tenham acesso a cuidados veterinários adequados. O texto não menciona seguros explicitamente, mas abre a porta a que a proteção financeira seja considerada parte dos "cuidados adequados".
Enquanto isso, nas prateleiras das lojas especializadas, os preços dos animais exóticos continuam a baixar - um furão por 80 euros, um camaleão por 60 - tornando-os acessíveis a mais pessoas. O paradoxo é evidente: o custo de entrada diminui, mas o custo de manutenção, especialmente o médico, mantém-se elevado.
Volto a Mariana e ao seu dragão-barbudo. "Agora tenho um seguro", diz, enquanto Zeus se aninha na sua mão. "Pago 12 euros por mês. No primeiro ano, já me salvou 400 euros em consultas e análises. Durmo melhor à noite."
O mercado está a mover-se, mas a passos de tartaruga - ou, neste caso, de dragão-barbudo. A verdadeira revolução acontecerá quando donos, veterinários e seguradoras entenderem que proteger um ouriço-pigmeu não é exótico: é responsabilidade.
Seguro para animais exóticos: o que os donos de répteis, aves e pequenos mamíferos precisam de saber