Nas ruas de Lisboa, enquanto um turista tenta desesperadamente fazer download de um mapa, um engenheiro da Altice testa em segredo uma conexão que promete velocidades 100 vezes superiores. Esta é a realidade paralela que se desenha em Portugal, onde a revolução das telecomunicações avança a dois ritmos distintos. Enquanto o 5G começa a chegar às principais cidades, os laboratórios já trabalham no que vem a seguir.
A cobertura 5G em Portugal tem sido um jogo de xadrez geográfico. As operadoras concentram-se nas áreas urbanas, deixando vastas regiões rurais na penumbra digital. Em contraste, países como a Coreia do Sul já têm 95% do território coberto. A questão que se coloca é: estamos a construir uma sociedade digitalmente dividida? Os dados do ANACOM revelam que apenas 35% dos municípios portugueses têm acesso a redes de quinta geração.
Nos bastidores, algo mais radical está a acontecer. Na Universidade do Porto, uma equipa liderada pela investigadora Marta Silva conseguiu transmitir dados a 1 terabit por segundo usando frequências de ondas milimétricas. Esta tecnologia, que será a base do 6G, permitirá coisas que hoje parecem ficção científica: cirurgias remotas em tempo real, hologramas perfeitos e a verdadeira internet das coisas.
O impacto económico desta revolução será profundo. Segundo um estudo da Deloitte, o 5G poderá acrescentar 2,5 mil milhões de euros ao PIB português até 2030. Mas o verdadeiro salto acontecerá com o 6G, criando novas indústrias que nem sequer conseguimos imaginar. Imagine fábricas completamente autónomas, onde robôs coordenam-se através de latências inferiores a 1 milissegundo.
No entanto, esta corrida tecnológica tem um preço ambiental pouco discutido. As novas redes consomem significativamente mais energia que as anteriores. A Vodafone Portugal revelou recentemente que o seu consumo energético aumentou 40% com a implementação do 5G. As operadoras prometem compensações através de energias renováveis, mas especialistas alertam para o risco de greenwashing tecnológico.
A segurança é outra fronteira crítica. À medida que conectamos tudo - desde carros a pacemakers - criamos superfícies de ataque exponencialmente maiores. O Centro Nacional de Cibersegurança já identificou vulnerabilidades específicas nas redes 5G portuguesas. A próxima geração de redes precisará de segurança desenhada desde a sua arquitetura fundamental, não como um pensamento posterior.
O que significa tudo isto para o cidadão comum? Nos próximos cinco anos, veremos desaparecer os buffering nos vídeos, mas também testemunharemos o nascimento de aplicações que misturam realidade física e digital de formas impossíveis hoje. A educação, a saúde e o entretenimento serão reimaginados. Uma criança nascida hoje poderá nunca conhecer o conceito de 'ficar sem rede'.
Portugal tem uma oportunidade única nesta transição. A nossa dimensão reduzida permite-nos ser um laboratório ideal para novas tecnologias. A NOS já está a testar em Cascais um sistema que usa o 5G para gestão inteligente do tráfego. Os resultados são promissores: redução de 30% nos tempos de deslocação durante as horas de ponta.
O caminho à frente está cheio de desafios. Regulação, investimento, formação de talento - todos estes elementos devem alinhar-se para que Portugal não fique para trás nesta corrida digital. As decisões que tomarmos nos próximos dois anos definirão a nossa posição na economia global das próximas duas décadas.
Enquanto escrevo estas linhas, no meu telemóvel alterna entre 4G e 5G, dependendo do canto do escritório onde me encontro. Esta inconsistência é um microcosmo do momento atual: entre o que prometemos e o que entregamos, entre o presente e o futuro, entre a conectividade que temos e a que precisamos. A verdadeira revolução começa quando a tecnologia deixa de ser notícia e se torna invisível - tão natural como a eletricidade nas tomadas. Esse dia está mais perto do que pensamos.
O futuro da conectividade: como as redes 5G e 6G vão transformar Portugal