Quando se fala em telecomunicações em Portugal, há uma história que se repete há décadas: a promessa de uma revolução tecnológica que nunca chega a todos por igual. Enquanto Lisboa e Porto celebram velocidades de internet que rivalizam com as capitais europeias, há aldeias onde o sinal de telemóvel ainda é uma miragem. Esta divisão digital não é apenas uma questão de conveniência - é uma falha estrutural que está a moldar o futuro do país.
O 5G chegou a Portugal com pompa e circunstância, mas a sua implementação tem sido tão desigual como a geografia do território. Nas cidades, os operadores competem para oferecer a velocidade mais impressionante, enquanto nas zonas rurais muitos portugueses ainda dependem de soluções improvisadas para ter acesso básico à internet. Esta realidade contrasta com o discurso oficial que pinta Portugal como uma nação digitalmente avançada.
A verdade é que os números contam uma história diferente. Segundo dados recentes, cerca de 15% do território nacional continua sem cobertura de internet de alta velocidade. São regiões onde escolas fecham porque não conseguem garantir aulas online, onde empresas não se instalam porque não têm conectividade, onde idosos ficam isolados porque não conseguem fazer videochamadas com familiares. Esta não é apenas uma questão técnica - é uma questão social que afecta directamente a qualidade de vida de milhares de portugueses.
Os operadores defendem-se com argumentos económicos: o custo de levar fibra óptica a uma aldeia remota pode ser superior aos retornos esperados. Mas esta lógica puramente comercial ignora o papel essencial que as telecomunicações desempenham no desenvolvimento regional. Sem acesso à internet, estas comunidades estão condenadas ao declínio, perdendo oportunidades de emprego, educação e até cuidados de saúde.
A solução pode passar por uma abordagem mais colaborativa entre operadores e governo. Em vez de cada empresa construir a sua própria infraestrutura em áreas lucrativas, porque não partilhar redes em zonas menos rentáveis? Esta ideia, embora controversa, já funciona noutros países europeus e poderia acelerar significativamente a cobertura nacional.
Enquanto isso, surgem tecnologias alternativas que prometem preencher estas lacunas. A internet via satélite, outrora reservada a grandes empresas, tornou-se mais acessível e pode ser uma solução temporária para áreas remotas. No entanto, os custos ainda são proibitivos para muitas famílias, criando mais uma barreira à inclusão digital.
O problema não se resume às zonas rurais. Mesmo nas cidades, a qualidade do serviço varia dramaticamente entre bairros. Há edifícios onde a fibra óptica chega até à porta, mas não entra porque os condomínios não autorizam as obras necessárias. Há ruas onde os cabos estão sobrecarregados, resultando em velocidades inconsistentes durante os horários de pico.
Os consumidores portugueses estão cada vez mais conscientes destas desigualdades. As queixas junto da ANACOM têm vindo a aumentar, reflectindo uma frustração crescente com serviços que não cumprem as promessas feitas nos contratos. Muitos sentem-se presos a operadores que não investem na melhoria da rede, mas que continuam a aumentar os preços.
A concorrência no sector tem sido intensa, mas nem sempre saudável. Em vez de competirem pela qualidade do serviço, os operadores frequentemente competem pelos preços mais baixos, criando uma corrida para o fundo que pode comprometer os investimentos em infraestrutura. O resultado são redes sobrecarregadas e serviços que não evoluem ao ritmo das necessidades dos utilizadores.
O futuro das telecomunicações em Portugal depende de uma visão mais abrangente que vá além do lucro imediato. É necessário reconhecer que o acesso à internet é tão essencial como a electricidade ou a água - um serviço básico que deve chegar a todos os cidadãos, independentemente de onde vivam.
As próximas gerações de tecnologia, como o 6G, já estão a ser desenvolvidas, mas de que serve planear o futuro se ainda não resolvemos os problemas do presente? Portugal precisa de um plano concreto para eliminar as zonas brancas de cobertura, com prazos realistas e financiamento adequado.
Enquanto jornalista que tem acompanhado este sector há anos, testemunhei promessas não cumpridas e oportunidades perdidas. A revolução digital em Portugal está a meio caminho - avançamos o suficiente para criar expectativas, mas não o suficiente para as satisfazer. O desafio não é apenas tecnológico, é sobretudo político e social.
Os portugueses merecem mais do que discursos optimistas sobre o futuro digital. Merecem uma rede de telecomunicações que funcione em todo o território, com qualidade e preços justos. Até lá, continuaremos a viver num país com dois ritmos de desenvolvimento: um que corre na autoestrada da informação e outro que ainda anda nos caminhos de terra batida.
O futuro das telecomunicações em Portugal: entre a promessa do 5G e a realidade das zonas rurais