Nas ruas de Lisboa e Porto, pequenas caixas metálicas começam a aparecer em postes de iluminação e fachadas de edifícios. São os nós das redes 5G, mas a sua instalação está a desencadear uma revolução silenciosa que vai muito além do download mais rápido de vídeos. As operadoras de telecomunicações estão a construir, sem alarde, a espinha dorsal das futuras cidades inteligentes.
Enquanto os consumidores discutem a velocidade da internet móvel, as operadoras negociam nos bastidores com câmaras municipais e empresas de energia. Os dados recolhidos pelos sensores das antenas 5G estão a alimentar sistemas que monitorizam o tráfego em tempo real, otimizam o consumo energético dos edifícios públicos e até preveem incidentes em infraestruturas críticas. É um ecossistema de dados que transforma cada torre de telecomunicações num centro de inteligência urbana.
O verdadeiro jogo, porém, acontece nos laboratórios de investigação das operadoras. A Vodafone, a NOS e a Meo estão a desenvolver parcerias com startups portuguesas para criar soluções que vão desde a agricultura de precisão no Alentejo até à monitorização remota de doentes crónicos. A rede 5G não é apenas um canal de comunicação – está a tornar-se a plataforma sobre a qual se constrói a próxima geração de serviços públicos e privados.
Esta transformação traz consigo questões delicadas sobre privacidade e soberania de dados. As câmaras municipais que dependem da infraestrutura das operadoras para os seus sistemas inteligentes estão, de facto, a entregar a gestão de dados sensíveis a empresas privadas. Os contratos, muitas vezes obscuros, estabelecem quem pode aceder à informação recolhida pelos sensores e como pode ser comercializada.
A aposta das operadoras nas cidades inteligentes explica, em parte, os investimentos milionários em infraestrutura 5G. Não se trata apenas de captar mais assinantes de telemóvel, mas de posicionar-se como operadores essenciais para a transformação digital das cidades. Quem controla a rede controla o fluxo de dados – e, numa economia baseada em informação, isso equivale a controlar o próprio funcionamento da urbe.
Os especialistas alertam para os riscos desta concentração de poder. Se as operadoras se tornarem os guardiões exclusivos dos dados urbanos, poderão criar barreiras à inovação e estabelecer monopólios de facto em serviços essenciais. A solução, defendem, passa por regulamentação clara e pela criação de infraestruturas neutras que permitam a múltiplas empresas desenvolver soluções sobre a mesma rede.
Enquanto o debate público se foca na cobertura e preços do 5G, uma batalha mais subtil desenrola-se nos gabinetes de decisão. As operadoras não estão apenas a vender internet mais rápida – estão a redefinir o seu papel na sociedade, transformando-se de meras fornecedoras de comunicações em arquitetas do ambiente urbano digital. O futuro das nossas cidades está, literalmente, nas suas mãos.
O lado oculto das redes 5G: como as operadoras estão a moldar o futuro das cidades inteligentes